Quando o então estudante de direito Augusto de Campos publicou aos 20 anos em 1951 seu primeiro livro, “Rei menos o reino”, iniciava-se um ciclo virtuoso que culminaria pouco tempo depois na Poesia Concreta, uma criação de Augusto e seu irmão Haroldo de Campos, ao lado de Décio Pignatari. Os três romperam com o Clube de Poesia e lançaram a revista “Noigandres”. Usando recursos visuais como a disposição geométrica das palavras na página, a aplicação de cores e de diferentes tipos de letras, Augusto criou "Poetamenos" (1953), "Pop-cretos" (1964), "Poemóbiles" (1974) e "Caixa preta" (1975). Boa parte dessa produção está reunida nas coletâneas "Viva vaia" (1979), "Despoesia" (1994) e "Não" (2004).
Além de traduzir Stéphane Mallarmé, James Joyce, Ezra Pound, Vladimir Maiakóvski, Arnaut Daniel e E. E. Cummings, entre outros, Augusto publicou as antologias "Re-visão de Sousândrade" (1964) e "Re-visão de Kilkerry" (1971). Seus textos críticos podem ser lidos em "Teoria da poesia concreta", "Balanço da bossa", "À margem da margem" e "O Anti-crítico", entre outros. Sua obra dialoga com a música, tem parceria em canções gravadas por Caetano Veloso e Arrigo Barnabé.
O filho de Augusto, Cid Campos, nascido em 1958, cresceu convivendo com os criadores da poesia concreta. E ocupou, dentro de casa, um espaço que parecia vago, o de músico-chave na parceria com o pai Augusto, com quem gravou o CD Poesia é Risco.
Aos poucos, como contou na live da quinta-feira, dia 2 de agosto (que você pode assistir no canal da memória da eletricidade), Cid fimou-se como músico, compositor e produtor musical.
– Também pudera – disse. – Ainda pequeno eu ouvia em casa Webern, Cage, Varèse, Stockhausen, Beatles, Hendrix, Janis Joplin, João Gilberto e ainda por cima assistia a shows particulares de Caetano, Tom Zé, Novos Baianos.
Daí para a frente, Cid participou dos grupos Papa Poluição e Sexo dos Anjos, e conviveu com a novíssima geração da música popular pós-tropicalista, como Walter Franco e Arrigo Barnabé.
Uma conversa muito rica, regada a áudios raros como os de Oswald de Andrade lendo seus poemas com seu jeitão muito particular; um audiovisual criado por Cid Campos em torno da canção mais emblemática da música nova brasileira, “Beba Coca-Cola”, composição de Gilberto Mendes sobre poema de Décio Pignatari.
Uma maravilhosa viagem pela criatividade muito refinada da família Campos, incluindo duas performances ao vivo do próprio Cid cantando e tocando violão em duas de suas composições que estão no seu álbum “Emily”, de 2017. Uma preciosidade: Augusto traduziu poemas de Emily Dickinson, poeta norte-americana do século XIX, Cid compôs a música. Treze poemas-canções deliciosos, como “Ata-me – eu canto assim”, que Cid interpretou ao vivo na live:
Ata-me – eu canto assim –
Bane-me – um bandolim
Soa, dentro de mim –
Mata-me – a Alma ainda
Canta até o Paraíso –
Tua até o fim –
A série de lives "Semana de Arte Moderna de 1922: Passado, Presente e Futuro" tem por objetivo construir, às vésperas da celebração do centenário da Semana de Arte Moderna de 1922, um amplo, diversificado e profundo painel da arte e da cultura brasileira. Com curadoria e apresentação do jornalista e crítico musical João Marcos Coelho, os bate-papos são transmitidos pela página da Memória da Eletricidade no Youtube, sempre às quintas-feiras, às 18h.