O modernismo ideal e o modernismo real

Postado em 22/07/2021
João Marcos Coelho
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A maior lição da live de quinta-feira, dia 15 de julho, tem tudo para modificar o modo como pensamos a Semana de 22 e o seu desdobramento histórico ao longo do século XX, o Modernismo: a crítica escrita por Monteiro Lobato em dezembro de 1917 no jornal “O Estado de S. Paulo” sobre a exposição da pintora Anita Malfatti não é, no mínimo, o que parece. Ou seja, não foi a crítica devastadora de Lobato que se transformou no estopim da Semana que aconteceria pouco menos de cinco anos depois, em fevereiro de 1922.

– Lobato era um nome importante, fundamental na cultura brasileira daquele momento – diz Chiarelli. – Mário e os outros do grupo que gestava a Semana queriam a todo custo o apoio dele para o evento. Ao mesmo tempo, enxergaram na crítica de Lobato a desculpa mais fácil para explicar o evidente recuo de Anita Malfatti. Segundo eles, ela era uma artista jovem e insegura, que se perturbou tanto com aquela crítica a ponto de jamais se refazer.

Anita Malfatti, "A Estudante Russa". Óleo sobre tela, 61cm x 76 cm. 1915. Coleção de Artes Visuais do Instituto de Estudos Brasileiros - USP (São Paulo). Crédito da imagem: Reprodução fotografica Leonardo Crescenti para a Enciclopédia Itaú Cultural

Chiarelli completa:

– Ora, Anita não era uma coitadinha que precisasse de incentivo ou apoio de ninguém. Ela simplesmente expôs obras que foram resultado de suas experiências na Europa, mas, em seguida, promoveu, moto próprio, marcha-a-ré em suas propostas vanguardistas.

Modernistas perderam dois trunfos numa só tacada

Em outras palavras, os modernistas perderam, numa só tacada, dois trunfos: a “pintora modernista” que precisavam (Tarsila não participou da Semana em 22) e também o importante personagem público que era Lobato.

– Isso desencadeou o que chamo de narrativa do Modernismo ideal. Lobato foi simplesmente desqualificado como crítico de arte (era “mau pintor”, segundo Mário). Ora, Lobato só pintava domesticamente, dominava as técnicas e jamais pretendeu ser pintor. Por outro lado, tinha conhecimento para exercer a crítica profissionalmente, o que fez entre 1915 e 1918 no Estadão.

Tadeu sabe do que fala. Sua tese de mestrado, dos anos 1990, intitula-se “Um Jeca no Vernissage” (Edusp, 1995) e sua tese de doutorado enfoca Mário de Andrade. Curador e crítico de arte, é professor titular na pós-graduação de Artes Visuais da ECA-USP. Foi diretor da Pinacoteca de São Paulo e do Museu de Arte Contemporânea da USP (MAC-USP). Também já atuou como curador-chefe do Museu de Arte Moderna de São Paulo (MAM-SP).

Vale o convite para vocês assistirem a esta live, que, de fato, nos ajuda a entender melhor as nuances e meandros das artes plásticas, não só no período pré-Semana de 22 como no pós-Semana, até a instituição da Bienal de São Paulo, no início dos anos 1950. 

Próximo episódio

Na próxima quinta-feira, 22 de julho, Fernando Luiz Lara, arquiteto e professor titular da Universidade do Texas (EUA), conversa sobre a arquitetura modernista.

Sobre a série Semana de Arte Moderna de 1922: Passado, Presente e Futuro

A série de lives "Semana de Arte Moderna de 1922: Passado, Presente e Futuro" tem por objetivo construir, às vésperas da celebração do centenário da Semana de Arte Moderna de 1922, um amplo, diversificado e profundo painel da arte e da cultura brasileira. Com curadoria e apresentação do jornalista e crítico musical João Marcos Coelho, os bate-papos são transmitidos pela página da Memória da Eletricidade no Youtube, sempre às quintas-feiras, às 18h.

Confira a programação da segunda temporada

Reinvenções modernistas no século XX

22/07
"A arquitetura modernista"
Com Fernando Luiz Lara, arquiteto e professor titular da Universidade do Texas (EUA)

29/07
"A escultura modernista: Victor Brecheret"
Com Daisy Piccinini, historiadora e critica de arte

05/08
"Concretismo, Oswald e a música"
Com Cid Campos, músico, compositor e produtor musica

12/08
"Tropicália, Mutantes & o Modernismo"
Com Carlos Calado, jornalista, autor de “Tropicália —A história de uma revolução musical” e “A divina comédia dos Mutantes” (Editora 34)

19/08
"A arquitetura da segunda metade do século 20"
Com Paulo César Garcez Marin, historiador e curador do Museu Paulista

Foto do thumb: Detalhe do quadro "O Japonês", de Anita Malfatti. Óleo sobre tela, 51cm x 61cm, 1915. (foto: Reprodução fotografica Romulo Fialdini para a Enciclopédia Itaú Cultural)

João Marcos Coelho