Como Mário de Andrade se transformou no maior intelectual público brasileiro do século XX

Postado em 21/04/2021
João Marcos Coelho
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Uma conversa fluida, fácil, porém muito bem construída pelo cientista político Milton Lahuerta, professor da Unesp-Araraquara (SP), percorreu a história do intelectual público, desde o Caso Dreyfus até o modo como Mário de Andrade, figura-chave da Semana de Arte Moderna de 1922, foi aos poucos assumindo o papel de intelectual público decisivo na história cultural do Brasil. [Para lembrar: o capitão Dreyfus, do exército francês, foi acusado em 1894 e condenado à prisão perpétua por ter vendido aos alemães informações secretas. A fraude foi denunciada no célebre artigo ”J’accuse...!”, uma carta pública endereçada ao presidente francês pelo escritor Emile Zola, que liderou a campanha pela libertação do oficial.

Em suas cartas e artigos Mário dedicou grande parte de seus esforços em torno do intelectual: ele deve permanecer numa torre de marfim ou descer à planície e marchar junto com as multidões? Está acima da sociedade e deve pensar apenas nas grandes questões? Ou deve fazer política para ver realizados seus ideais? Esta questão foi brilhantemente exposta pelo professor Lahuerta na quinta live da primeira temporada da série "Semana de Arte de 1922: Passado, Presente e Futuro", da Memória da Eletricidade, no último dia 15 de abril.

O projeto do Departamento de Cultura da Prefeitura de Sâo Paulo, concebido e concretizado por Mário de Andrade, seria o protótipo de um grande projeto cultural e artístico para o país – não fosse o Estado Novo, que, em 1937, interrompeu um sonho que teria tudo para ser bem-sucedido no plano nacional.

A autocrítica dura que fez em 1942, a vinte anos de distância da Semana, reflete seu estado de espírito deprimido. A ponto de, em seus últimos escritos – o inconclusivo “Banquete” e o prefácio para a biografia de Shostakovich escrita por Vitor Seroff –, Mário ter optado por uma virada radical, no sentido de que o intelectual deveria colocar a mão na massa.

– Ou seja – afirmou o professor Lahuerta – assumir posições políticas.

De Mário de Andrade a Darcy Ribeiro

A riqueza de informações, o enfoque certeiro apontando Mário de Andrade como o maior intelectual do país no século XX (no sentido de que ele tomou para si a responsabilidade pela realização de um projeto de Brasil), tudo isso me levou a pensar em outro intelectual que também tinha esta chama sagrada da dedicação total a um projeto nítido de Brasil: o antropólogo Darcy Ribeiro (1922-1997), que não só concebeu e dirigiu a Universidade de Brasília nos anos 1960 como, duas décadas depois, concebeu e concretizou os Cieps, (Centros Integrados de Educação Pública no Rio de Janeiro), replicados já no início do século XXI em São Paulo como CEUs (Centros Educacionais Unificados).

Na próxima live, na quinta-feira, dia 29 deste mês, Marcos Antonio de Moraes, autor de um livro extraordinário sobre as cartas de Mário de Andrade, vai esmiuçar os motivos que o transformaram no maior intelectual do Brasil do século XX: Mário respondia a todos que lhe escreviam, sobretudo aos jovens.

– Fazendo um trabalho precioso – avalia Milton Lahuerta – de formação para candidatos a escritores, pintores, músicos e, por que não?, novos intelectuais.

Próximo episódio

Na próxima quinta-feira, dia 29 de abril, o professor Marcos Antonio de Moraes, do Instituto de Estudos Brasileiros (IEB) da USP e autor de “Orgulho de jamais aconselhar – a epistolografia de Mário de Andrade” (Edusp, 2007) fala sobre o grande missivista que foi Mário.

Programação

Confira a programação completa da primeira temporada da série de lives "Semana de Arte Moderna de 1922: Passado, Presente e Futuro". Os episódios são transmitidos sempre às quintas-feiras, às 18h, no canal da Memória de Eletricidade no Youtube.

Tudo que você precisa saber sobre a semana de 22:

Abril:

29/4 – Está tudo nas cartas – Mário de Andrade foi o maior missivista do Brasil no século XX. Escreveu cartas prodigiosamente, fez delas seu jeito de conversar com os amigos mas também com todos os que o procuraram. Com Marcos Antonio de Moraes, do Instituto de Estudos Brasileiros (IEB) da USP e autor de “Orgulho de jamais aconselhar – a epistolografia de Mário de Andrade” (Edusp, 2007).  

Maio:

6/5 – O grande esquecido – Sérgio Milliet – Com o historiador Carlos Guilherme Mota, professor emérito da USP e Mackenzie, que prepara um livro sobre Milliet.  

13/5 – A força da poesia modernista – Com Manuel da Costa Pinto, jornalista, crítico literário e curador do Prêmio Oceanos.

20/5 – A Semana e as vanguardas latino-americanas na década de 1920 – Viviana Gelado, professora de literatura latino-americana na Universidade Federal Fluminense (UFF), autora de "Poéticas da transgressão: vanguarda e cultura popular nos anos 20 na América Latina".

27/5 – Revolução nas Artes Plásticas: Anita Malfatti, Tarsila e a Semana de 22 – Com Francisco Alambert, professor de História da Arte e Cultura Contemporânea, História (USP) professor de História da Arte e Cultura Contemporânea, História (USP) e autor de "A Semana de 22 - A aventura modernista no Brasil".  


João Marcos Coelho