Ampliando o papel estratégico

01/06/2022

“Cada ser troca com o mundo que o rodeia os elementos que lhe permitem sobreviver. Essa é a razão pela qual a comunicação é uma característica essencial da vida. Sem ela, mesmo os organismos mais simples não teriam a possibilidade de manter o equilíbrio delicado que representa a própria vida.” (Stefano Mancuso)

Do primeiro contato com o texto até a estreia de uma peça de teatro, há um longo processo de elaboração e produção, geralmente invisível aos olhos do público. Sempre há muita gente talentosa e muita labuta envolvidas. Nas atividades de comunicação empresarial não é diferente. Por trás de cada cena, temos um mundo de interações que vale a pena conhecer. Faço um convite para que o leitor vislumbre os bastidores desse espetáculo.

Em minha carreira profissional, que se desenrolou quase inteira na Eletrobras, pude acompanhar toda a segunda metade da trajetória da companhia. Quando ingressei, desempenhei o papel de profissional de preservação de memória e, logo em seguida, a função de coordenadora de Pesquisa da Memória da Eletricidade. Desse lugar, tive a oportunidade de conhecer e analisar coleções de documentos, fotos, publicações e entrevistar profissionais de diversas áreas para o Programa de História Oral da instituição.

Enfim, precisei me debruçar sobre muitos temas da história do setor de energia elétrica brasileiro. Tive o privilégio de aprender por dentro e em detalhe a história das empresas do grupo e de várias pessoas que dedicaram a vida profissional às empresas Eletrobras. Considero que esse mergulho em profundidade produziu bons resultados. Entre eles, destaco o primeiro trabalho do qual participei, uma abrangente história do setor e da Eletrobras, o Panorama do Setor de Energia Elétrica no Brasil, publicado em 1988 e reeditado com atualizações em 2006. A este trabalho, ainda hoje uma referência, seguiram-se vários outros, seja sobre a história de empresas e de empreendimentos do grupo e de outras instituições do setor, seja sobre temas diversos como energia elétrica e urbanização, o rio Tocantins e os viajantes, o meio ambiente e o setor elétrico e a integração da América do Sul a partir da energia elétrica.

Há cinco anos, desde que migrei para a área de Comunicação e Relações Institucionais da Eletrobras, comecei a ver a empresa de outro lugar, outro ponto de vista. Passei a observar, dos bastidores da Comunicação, a complexa dinâmica de interação da companhia com seus vários stakeholders.

Um dos maiores desafios da comunicação empresarial de companhias de grande porte e com extensa área territorial de atuação, como a Eletrobras, é construir e disseminar mensagens alinhadas. Que mensagens divulgar em conjunto com todas as subsidiárias que compõem o grupo, respeitando, ao mesmo tempo, as características que distinguem cada empresa e enriquecem a identidade de todas? Esse questionamento pontua as atividades de coordenação da Comunicação da holding o tempo todo.

Hoje, além de duas usinas termonucleares e de metade da hidrelétrica de Itaipu, administrada pelo Brasil em parceria com o Paraguai, a Eletrobras inclui outras quatro empresas geradoras e transmissoras de energia elétrica, com operações em todo o território brasileiro e relevante participação no Sistema Interligado Nacional (SIN).

Interessante notar que duas dessas subsidiárias são anteriores à própria holding. A Eletrobras Chesf, sediada no Recife, foi fundada em 1945 e é a mais antiga do grupo. Sua produção está concentrada nos estados nordestinos. A Eletrobras Furnas, criada em 1957 com escritório central no Rio de Janeiro, conta com instalações em todas as regiões do país, além do Distrito Federal.

Surgidas já como subsidiárias da holding, as outras duas têm também história própria. A Eletrobras CGT Eletrosul, sucessora da Eletrosul original nascida em 1968, tem sede em Florianópolis e atua nos estados da região Sul e em Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Rondônia e Pará. A Eletrobras Eletronorte, criada em 1973, com sede no Distrito Federal, tem unidades produtivas em todos os nove estados da Amazônia Legal: Acre, Amapá, Amazonas, Maranhão, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins.

Por essa rápida descrição de cada uma das quatro empresas, considerando a data de criação e o local de atuação, dá para imaginar a diversidade de paisagens, climas, histórias, experiências e culturas que cada uma das companhias carrega.

A holding Eletrobras, que completa 60 anos de história este ano, sempre se relacionou com uma multiplicidade de subsidiárias e associadas. O número e o tipo das empresas do grupo variaram ao longo do tempo, mas a necessidade de convergência em projetos e visão de futuro sempre esteve presente.

Esse alinhamento entre as empresas do grupo, tão necessário, passa pelo trabalho estratégico da área de Comunicação. A adoção por todas as empresas Eletrobras de uma única identidade visual de marca, em 2010, foi uma das mais relevantes iniciativas de comunicação para traduzir e fomentar a integração entre as empresas. O uso da marca comum mostra de forma imediata o conceito de grupo, não apenas para o público externo, mas também para cada uma das empresas e seus colaboradores. Na esteira dessa marca, foram unificados também os estatutos de todas as subsidiárias e adotado um planejamento estratégico para todo o grupo.

No cenário atual em que tudo muda o tempo todo, a comunicação efetiva, capaz de fazer chegar a cada stakeholder a informação que interessa, depende de apurada escuta, precisão na escolha das ferramentas de comunicação mais adequadas a cada situação e, ainda, muita agilidade e uso de inteligência de dados. Para cativar, cultivar e qualificar o relacionamento com os públicos, essas atitudes importam.

O ponto de partida de todo o trabalho é a identidade empresarial do grupo – seu propósito, sua missão e seus valores – conjugada às políticas e normativas que estabelecem a forma de conduta comum às empresas. É muito importante apontar a grande evolução na governança dos assuntos de comunicação que o grupo experimentou. Atualmente, todas as empresas seguem as mesmas regras, constantemente aperfeiçoadas, como as políticas de Comunicação e Engajamento com Públicos de Relacionamento e de Porta-vozes e o Manual de Gerenciamento de Crises, entre outros documentos.

Quanto aos canais de comunicação, a Eletrobras também acompanhou as novas formas de comunicação que foram surgindo e sendo adotadas pela sociedade.

Um exemplo foi a criação de perfis oficiais das empresas em diversas redes sociais a partir dos anos 2000. A Comunicação tem trabalhado para dinamizar a presença digital do grupo Eletrobras, com publicações integradas com todas as empresas. As postagens em conjunto são guiadas por um calendário de temas relevantes, sem prejuízo para a programação de publicações sobre assuntos de interesse específico de cada empresa, que seguem acontecendo normalmente. Essa prática promove uma intensa troca e colaboração entre os profissionais envolvidos e amplia o alcance das mensagens estratégicas, reforçando a identidade do grupo.

Nos últimos anos, outro fenômeno que exigiu muitas adaptações foi a crescente digitalização, incluindo a dos veículos de comunicação. Os jornais e informativos impressos foram sendo substituídos paulatinamente por versões virtuais. Os programas de áudio assumiram mais recentemente a forma de podcasts. E as tevês corporativas adotaram os filmes e vídeos em formato eletrônico e linguagens mais inovadoras.

A digitalização conectada com a comunicação interna nas empresas Eletrobras tem um grande avanço em vias de se concretizar: a integração das intranets! Como a construção de reputação começa dentro de casa, esse projeto é bastante auspicioso. A comunicação dirigida especialmente aos colaboradores (e seus familiares) é fundamental para o desempenho empresarial e o enfrentamento bem-sucedido das constantes mudanças do ambiente corporativo, que demandam a motivação e o engajamento da força de trabalho.

No cotidiano, uma parcela das informações institucionais, aquelas de caráter estratégico, é divulgada simultaneamente pelo conjunto das empresas, a partir da holding. Ao longo do último ano, por exemplo, foram veiculadas para o público interno de forma integrada mais de 30 campanhas sobre temas diversos. Além de agilidade, essa atuação integrada requer bastante sintonia e colaboração entre as equipes de Comunicação.

No ano passado, a Comunicação lançou dois programas que funcionam como disseminadores da cultura da Comunicação para toda a empresa: o Influenciadores Eletrobras e o Eletrobras Talks.

Ao primeiro programa aderiram, por enquanto, a holding e a Eletrobras Furnas. No ciclo atual, de 2022, temos 63 empregados participando de forma voluntária como embaixadores da marca. Cada influenciador amplia a capilaridade dos canais de comunicação. O grupo também avalia campanhas de comunicação e a aderência das mensagens nas áreas das empresas.

Também com foco no aperfeiçoamento da competência de comunicação do público interno, estamos este ano no segundo ciclo do Eletrobras Talks, dirigido aos gestores das empresas do grupo. Em encontros mensais, conteúdos de comunicação e temas transversais são debatidos, estabelecendo trocas, promovendo reflexões e estimulando a ação dos gerentes como multiplicadores.

A Eletrobras procura de forma sistemática estreitar o relacionamento com suas empresas a partir de vários espaços de troca, convivência e colaboração. Com essa inspiração, a empresa coordena o Comitê de Comunicação Integrada das Empresas Eletrobras, que reúne superintendentes de Comunicação e técnicos de todas as companhias do grupo em busca de ganhos de sinergia com ações integradas de comunicação. O comitê é o fórum que possibilita o alinhamento essencial diante de uma realidade que exige cada vez mais integração.

Entre as várias atividades do comitê a cada ano, algumas são fundamentais para uma atuação afinada. Assim como em uma peça de teatro a escolha do texto é uma das primeiras providências para o espetáculo, a proposição, discussão e aprovação de um tema a ser trabalhado a cada ano é o ponto de partida para o desenvolvimento de uma série de ações e campanhas de comunicação. As decisões colegiadas se desdobram então em diversas frentes de trabalho. O estabelecimento de um calendário comum, composto por datas de referência, também faz parte do planejamento do comitê, assim como o debate sobre as melhores estratégias para a execução do plano integrado de comunicação anual, o lançamento de editais conjuntos de patrocínio e a participação conjunta em estandes integrados em eventos do setor, observados evidentemente os recursos e as condições de cada empresa.

A discussão de cada tópico e as tomadas de decisão do comitê têm como pano de fundo as identidades específicas de cada empresa e as injunções particulares a que estão submetidas em suas regiões. As tensões e eventuais dissenções costumam ser superadas pelo profissionalismo e companheirismo dos colegas comunicadores das empresas Eletrobras, que sempre pactuam os melhores encaminhamentos possíveis.

Após a pactuação, as empresas muitas vezes fazem ajustes para adaptar ainda mais o tom às suas especificidades. Entretanto, o mais relevante é que prevalecem as traduções mais fiéis das mensagens institucionais, veiculadas em conjunto. Os resultados do trabalho do comitê e das empresas depende, portanto, de coordenação, mas também de flexibilidade.

Certamente são muitas as possibilidades e os benefícios da atuação conjunta em comunicação das empresas Eletrobras sob a coordenação da holding com a participação de todas as companhias em várias frentes: comunicação interna, comunicação visual, gestão de mídias sociais e site, atendimento a demandas de imprensa, assessoria parlamentar, organização de eventos, gestão de marca e reputação, ações de patrocínio e responsabilidade social.

O reconhecimento do papel estratégico da comunicação para a construção e a projeção de imagem e reputação positivas e para aumentar cada vez mais o engajamento de seus públicos tem crescido de maneira consistente na Eletrobras.

Um indicativo seguro desse fato é a inclusão de programas específicos de comunicação no Plano Diretor de Negócios e Gestão (PDNG) da companhia. A recente evolução dos aspectos ESG molda o relacionamento com os diferentes públicos da empresa e pede uma abordagem não apenas integrada, mas em perfeito alinhamento com as áreas gestoras, os programas de patrocínio e voluntariado e demais ações de responsabilidade social.

Externamente, a Eletrobras também tem conquistado avaliações favoráveis. Nos dois últimos anos, a companhia foi listada na primeira posição entre as empresas elétricas no ranking das 100 empresas brasileiras com melhor reputação do Monitor Empresarial de Reputação Corporativa (Merco).

As principais ações programadas para a celebração dos 60 anos também refletem essa atuação integrada, a construção não apenas de uma imagem, mas de uma história em que cada uma das empresas é uma personagem importante. A exposição virtual, a série especial de podcasts narrativos, o livro institucional e ainda o Desafio FazGame Eletrobras60, voltado para o público jovem, são exemplos de ações de comunicação integrada que demonstram o alinhamento com o propósito da empresa e traduzem o olhar estratégico da comunicação para o fortalecimento das principais mensagens da empresa junto aos seus públicos de relacionamento. ///

Este artigo foi originalmente publicado na Revista Comunicação e Memória, da Memória da Eletricidade, na edição Nº6/ 2022, em edição especial sobre os 60 anos da Eletrobras.

Referências Bibliográficas:

DUARTE, Fábio, QUANDT, Carlos, SOUZA, Queila (Orgs.). O tempo das redes. São Paulo: Perspectiva, 2008.

MANCUSO, Stefano. A revolução das plantas: um novo modelo para o futuro. São Paulo: Ubu, 2019.

NASSAR, Paulo; Figueiredo, Rubens. O que é comunicação empresarial. São Paulo: Brasiliense, 2006.

NEIVA, Eduardo. Dicionário Houaiss de comunicação e multimídia. São Paulo: Publifolha, 2013.

SOUZA, José Eustáquio Oliveira de. O gerente comunicador: um guia prático da comunicação gerencial. São Paulo: Aberje, 2010.