Por que investir em memória empresarial
Pesquisa realizada em 2020, numa parceria entre a Associação Brasileira de Comunicação Empresarial (Aberje) e a Memória da Eletricidade apontou que ainda é pequeno o número de empresas que mantêm um programa estruturado e recorrente de memória empresarial. Realizada entre 10 de setembro e 20 de outubro de 2020 e divulgada em dezembro do mesmo ano, "A História e Memória Empresarial nas Organizações no Brasil" constatou que, de um total de 117 instituições que participaram do estudo, 18% delas (21 empresas) têm programa estruturado de memória empresarial, enquanto 29% (34 empresas) não têm uma iniciativa do tipo, mas desenvolvem ações eventuais em torno do tema. A pesquisa revela ainda que 5% (6 empresas) tiveram um programa tipo em algum momento, mas encerraram, e 48% (56 empresas) não têm programa nem desenvolve ações eventuais. Se, por um lado, os números mostram uma baixa preocupação por parte das empresas em registrar e divulgar sua história, por outro, apontam que este é um mercado com alto potencial de desenvolvimento.
Mas por que a memória empresarial deveria ser uma preocupação e parte da estrutura e da rotina das empresas? Apesar de geralmente pouco explorada, a história de uma organização constitui um recurso empresarial importante. Contribui para o reforço da marca junto ao público. Os centros de memória empresariais, por exemplo, são uma forma potente e eficiente que as instituições usam para estreitar relações com clientes, fornecedores, colaboradores e também com outras organizações, sejam estas privadas ou estatais. Essas instituições de guarda podem funcionar como museus e centros culturais, abertos a público e pesquisadores. Neles, o interessado pode ter acesso à documentação histórica da organização, rever sua trajetória e entender seu relacionamento com a sociedade e contribuição para o país.
A memória empresarial é, portanto, parte importante da comunicação empresarial. Nesse sentido, além dos centros de memória e museus, é desejável para uma empresa investir em publicações que contem a sua história ou do setor em que atuam. Porém, isso implica na montagem de uma equipe especializada, com historiadores, jornalistas, pesquisadores, arquivistas, bibliotecários e profissionais de editoração. Uma outra alternativa é a contratação de empresas e instituições especializadas nesse tipo de serviço.
A importância dos profissionais gabaritados
Paulo Nassar, professor doutor da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA/Usp) e diretor presidente da Aberje destaca a importância do uso de profissionais gabaritados:
– História não é ficção. Deve ser objeto de estudo de especialistas e não apenas servir à construção de narrativas heróicas, sagas, celebrações e biografias elogiosas.
Um breve histórico
A noção de memória empresarial e a necessidade de se contar a história das organizações surgiu na Europa, no começo do século XX, com as alemães Siemens e a Krupp. Na década de 1920, o curso de Administração da universidade estadunidense de Harvard, cria uma cadeira com dedicada ao tema. A disciplina Memória Empresarial tinha por objetivo estudar a biografia dos empreendedores e a evolução das instituições. Isso possibilitaria entender melhor o funcionamento das organizações e aprender técnicas de administração de negócios.
Na Europa, nos anos 1970, empresas passaram a contratar o historiadores e arquivistas para registrar e organizar documentos. Um dos profissionais mais conhecidos desse período é o historiador francês Maurice Hamon, responsável pela implantação do Centro de Arquivos Saint-Gobain. Em entrevista à revista Memória Eletropaulo, Hamom relembrou sua função à época:
– Tinha como responsabilidade a constituição, a guarda e a exploração da memória coletiva como uma finalidade precisa: compreender melhor o passado para viver o presente e preparar o futuro.
Transmissão do conhecimento, um benefício fundamental
A fala de Maurice Hamon resume outro benefício importante que a preservação da memória traz para as empresas: a transmissão do conhecimento. O registro de processos, técnicas e modelos de gestão em documentos que possam ser consultados por gerações futuras de empresários e empregados ajuda a manter a empresa viva, constantemente atualizada e com mais possibilidade de rever estratégias com agilidade na tomada de decisões. Nesse sentido, memória empresarial não é apenas uma forma eficaz de apresentar a tradição do empreendimento, mas é um elemento importante para compor análises de contexto e de riscos.
No Brasil, a memória empresarial começou a ser discutira nas universidades na década de 1960, a partir dos modelos acadêmicos europeu e estadunidense. De lá para cá, esse movimento cresceu, e as décadas de 1980 e 1990 registram o surgimento das primeiras agências especializadas em memória empresarial. Vale, Chocolates Garoto, ArcelorMittal Tubarão, Klabin, Organizações Globo, Grupo Águia Branca, Eletropaulo, Petrobras, Eletrobras e Furnas são algumas das empresas brasileiras que investem em memória empresarial.
Memória empresarial produz matéria-prima para outras aplicações
O futuro aponta ótimas possibilidades para profissionais e organizações interessadas em investir no setor. Memória empresarial atualmente engloba a gestão do patrimônio informativo das instituições, pois, à historiografia uniu conceitos e métodos das ciências da informação e das tecnologias de comunicação, que, hoje, são essenciais para a organização e disponibilização de documentos que registram a trajetória de uma empresa e que são fontes para a análise histórica. Isso demanda um trabalho sistemático de análise e organização de dados – alguns intangíveis – que podem resultar em produtos concretos: publicações, filmes, sites, exposições, eventos, cursos centros de documentação e memória. Ou seja, todo o trabalho realizado dentro de uma linha de memória empresarial produz matéria-prima para várias aplicações. Memória empresarial constrói conhecimento, fundamenta os valores corporativos e reforça a reputação das organizações e os atributos de marcas.